Translate

EDUCAR É, ANTES, SENTIR... E TODOS SÃO CAPAZES DISSO.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

“VOCÊ TEM UM PROBLEMA?”

POR MARI MONTEIRO



O título deste artigo até parece um daqueles anúncios de tarô e afins colados nos postes da cidade. Não é o caso. A pergunta é LITERAL e VISCERAL. Tenho um amigo muito querido, de longa data, cujo nome é Mailson e trabalhamos muito tempo juntos. Outro dia nos reencontramos rapidamente (depois de mais ou menos uns três anos); tempo suficiente para relembrarmos algumas passagens bem “punks” das nossas vidas. Ele me disse algo interessante. “Mari, sempre que ouço alguém reclamando de banalidades; mas banalidades mesmo: ‘Eu quero uma calça de 500 reais e só posso comprar no mês que vem! ’; ‘Putz! Não irei ao próximo show internacional! ’; ‘MINHA MÃE PEGA MUITO NO MEU PÉ! ’ e por aí vai... A vontade que tenho é dizer: ‘Vem cá amigo, então você tem um problema? Vou te contar uma história. ’ E dizer daquilo que ocorre de mais forte em nós, que nos ARRASTA e nos deixa à deriva, sem bote salva-vidas E SEM MÃE PRA PEGAR NO PÉ...”.

Problemas? Os problemas têm um jeito próprio de machucar e de abater a cada pessoa. O fato é que todos têm (em maior ou menos grau). A questão é que alguns deles nos colocam DIANTE DE UM ESPELHO para o qual não queremos olhar e dizem: “E agora?”. Aí, nos olhamos, com certo desconforto, e devolvemos a pergunta: “E AGORA?”. E lá está você, o espelho e sua fé. Porque, acredite, nestes momentos, o espelho não reflete mais ninguém. Apenas você. Seus amigos estão longe, seu pai e seus irmãos também. E SUA MÃE NÃO ESTÁ LÁ PARA PEGAR NO SEU PÉ.


Agora, como diz meu amigo Mailson, vem cá que vou te contar uma história. Era uma vez um menino de oito anos chamado Felipe, está no segundo ano, não sabe ler, nem escrever e já viu muita coisa ruim nesta vida. Tive o prazer de conhecê-lo este ano. Era para ter sido uma simples aula de leitura... Mas, que leitura?

(...) Estávamos no meio de um momento de leitura. Quando eu, sem saber da história, sugeri ao Felipe que estudasse mais em casa, que pedisse ajuda à sua mamãe. Infeliz momento.
 FELIPE: Num dá. Só estou com meu pai.
- Por quê?
FELIPE: Porque minha mãe bebeu soda.
(Imediatamente me lembrei de ter ouvido dizer que a mãe de um aluno da escola havia ingerido soda cáustica).
- Por que ela bebeu soda?
FELIPE: Porque ela queria morrer.
- E por que ela queria morrer?
FELIPE: Pra ir pro céu (sic).
- Onde ela está agora?
FELIPE: No Magine (ele quis dizer Nardine – um hospital público da região)
- Como ela está?
FELIPE: Ela está bem magrinha (e mostrou com os dedinhos...).
- Você acha que ela iria para o céu se morresse?
FELIPE: Acho “móde (sic) que” ela tava ino (sic)  na igreja e depois não ia mais e o diabo estava dentro dela. E tem uns que vai pra baixo... Pra treva. No dia que ela bebeu soda, ela disse que eu só ia ter mãe naquele dia.
- Você quer ficar pra sua mãe ou com seu pai?
FELIPE: Quero ficar com minha mãe, mas num vô (sic) podê (sic) só porque móde(sic) ela bebeu soda.
- E agora?
FELIPE: Ela vai pra Goiânia quando sai do hospital, móde (sic) que meu irmão tá (sic) lá.
- Por que ele foi embora?
FELIPE: Foi com minha vó(sic). Quando eu ficar grande eu vou também pra Goiânia móde (sic) que quero ficar com minha mãe.
- Você promete vir conversar comigo todo dia? Promete?
FELIPE: se minha prô (sic) deixar, eu venho.

(...)
Alguns dias depois, para minha surpresa, apareceu um rostinho na porta e se escondeu. Chamei: “Felipe?” Mal terminei de falar e ele pulou nos meus braços e me abraçou com força. E A MÃE DE FELIPE NÃO  ESTAVA MAIS POR PERTO PARA LHE OFERECER COLO . Ela havia partido três  dias depois do nosso encontro.


Penso que existem problemas que são grandes demais para pessoas pequenas demais; não falo apenas sobre os dramas infantis semelhantes ao de Felipe; falo de mim; falo de você; de nós que, quando fragilizados, tomamos a forma e o tamanho de um bebê indefeso. Pedimos colo. E NEM SEMPRE NOSSA MÃE ESTARÁ ALI PARA NOS OFERECER COLO.  E quando você e eu acharmos que temos um problema, olhemos para os lados, ouçamos outras histórias... NÃO PARA NOS CONFORMARMOS (aquela coisa irritante de ouvir sobre zona de conforto, o clichê: “tem gente passando coisa pior!”); mas para dizer NÃO! NÃO PODE SER PARA ISSO QUE ESTAMOS AQUI. A vida não deve ser assim. Mesmo porque, segundo um poeta: “reza a lenda que a gente nasce é para ser feliz!” ENTÃO QUAL É O PROBLEMA? O problema é o percurso. É nele que nos perdemos e nem sempre nos reencontramos; mas sempre há de ter algo de bom em cada dia vivido; porém, sem OLHOS ATENTOS e CORAÇÕES HUMILDES, não veremos estes momentos. Vamos atropelá-los e, à noite, nos deitaremos apenas com as amarguras.


SOLUÇÕES? Quem dera as tivesse. Mas, sou abusada. Do contrário não estaria aqui pra contar a história. Tenho sensações, INTUIÇÕES e a principal é a de que devemos aprender a fazer o contrário: superestimar os risos e a presença discreta de qualquer traço de esperança, as palavras ditas com doçura e os olhares.  Ah! Os olhares! Estes são inesquecíveis; aqueles que se demoram e que mergulham em outro olhar, dizendo muito apenas com o silêncio e com suas cores; os abraços... Que, tomara, um deles seja o da NOSSA MÃE QUE AINDA ESTARÁ POR PERTO... E, se não mais estiver fisicamente, como a mãe do Felipe, que aconteça o que desejei a ele: que possamos nos lembrar de SEU OLHAR, sentir seu CHEIRO DE MÃE e seu colo que cura todas as dores deste mundo. Mas, enquanto ela estiver por perto, não passe um só dia sem dizer que a ama; abrace-a sempre que possível... Sem pressa, deixe que seus corações se encontrem. Converse olhando nos olhos dela. Decore sua íris... Memorize seu cheiro... Valorize sua presença. Porque quando, finalmente, restarem apenas lembranças, seus sentidos vão cobrar todas estas sensações e você as terá guardadas no lugar mais sagrado que existe: NA SUA ALMA!
Frase creditada  ao Roberto Frejat (Barão Vermelho)

COMENTE!